31 março 2006

TEMA DO MÊS


CAMPANHA DA FRATERNIDADE 2006
FRATERNIDADE E PESSOAS COM DEFICIÊNCIA

“Pessoas especiais”? “Pessoas portadoras de deficiência”? Ao longo da história recente foram diversas as maneiras de denominar esses irmãos, que são freqüentemente vítimas de exclusão social e de discriminação. Levando em conta diversas observações de grupos organizados de pessoas com deficiência e de especialistas no trato com elas, preferiu-se a denominação “pessoas com deficiência”. Esta é a nomenclatura geralmente usada no presente.

Quem são as pessoas com deficiência? São tantas: Cegos, surdos, mudos, os que têm algum tipo de lesão ou invalidez física, ou deficiência mental; os que dependem de condições especiais para viverem. E tantos outros. Esses grupos preferem ser reconhecidos como tais, e que a sociedade os leve a sério, como são, sem tentar camuflar sua deficiência, nem pretender que devam ser em tudo iguais aos outros.

O lema, por sua vez, é tomado da passagem do evangelho de São Marcos, onde Jesus cura um homem da mão atrofiada, que estava na sinagoga. Tudo leva a pensar que aquele pobre homem era desprezado e deixado lá num canto, por causa da sua condição. Os fariseus observam, para ver se Jesus o curava, embora fosse sábado: Precisavam de um argumento para acusá-lo. Jesus chamou o homem: “Levanta-te, vem para o meio!” E o curou, na frente de todos.

A palavra de Jesus restitui dignidade àquela pessoa com deficiência; é um convite para que tome coragem e venha para o meio dos outros, venha ocupar o seu espaço social e eclesial, e não tenha medo nem sinta baixa auto-estima; aquele pobre homem deve saber que é gente e tem valor; sua deficiência não lhe impede de viver. Ao mesmo tempo, a palavra e atitude de Jesus são uma mensagem para os outros, os saudáveis e válidos, os que têm a capacidade de raciocinar e até para tramar coisas ruins: Nada de deixar de lado os que têm alguma deficiência, nada de desprezá-los e abandoná-los a si próprios; todos devem acolhê-los e valorizá-los, ajudando-os a se tornarem livres, apoiando-os fraternalmente em vista da sua inclusão social.

O exemplo e a palavra de Jesus continuam a nos desafiar para fazermos o mesmo que ele fez. Em nossos dias, a cultura dominante vai afirmando a tendência a valorizar apenas os fortes, os belos, os que têm um corpo perfeito, os que são capazes de competir e se afirmar, quem pode mais... E com isso, tantas pessoas que não se enquadram nos padrões impostos pelo mercado, a moda e os preconceitos sociais, vão ficando de lado, abandonadas a si próprias, lá num cantinho.
Com certeza, a Campanha da Fraternidade de 2006 será ocasião para uma grande tomada de consciência sobre a realidade geralmente não fácil enfrentada pelas pessoas com deficiência. Será objetivo da Campanha promover em relação a elas atitudes fraternas e ações voltadas para uma verdadeira cultura da solidariedade humana e da fraternidade cristã, que se traduza em leis justas e políticas públicas adequadas para favorecer o reconhecimento de sua dignidade e seus direitos. Deus nos ajude!

* da carta de Dom Odilo Pedro Scherer - CNBB

FILOSOFIA


PENSAR É UM PERIGO
por George Francisco Corona

Perceber a realidade que o cerca, saber distinguir o justo do injusto, o certo do errado, o bem do mal, o que se pode fazer ou não, ou mesmo o que se pode ser ou não ser, é o que dá condições ao sujeito de se libertar da opressão e do domínio.

Essa é a realidade: podemos escolher entre obedecer submissamente, algumas cabeças que pensam (realidade) ou pensar com nossas próprias cabeças (graças a Deus isso é possível).
As batalhas mais bem travadas dos últimos anos não são mais aquelas ao "fio da espada" nem as de "projéteis avançados" mas aquelas de "argumentos". Vá até o gabinete do prefeito com uma espada ou com um fuzil. No máximo você conseguirá ser surrado por policiais e será detido... mas vá até esse gabinete com um bom argumento e você poderá causar um "estrago".

Não podemos mais negar a importância da razão humana para "todos os humanos". Mas, se isto é evidente, porque na realidade a maioria do povo é acrítico e aceita tudo que se lhe impõem?

Ora, porque as pessoas - que são dotadas de razão - não reagem às leis e às imposições injustas que poucos privilegiados as carregam? Na sociedade em que vivemos mandará aquela minoria privilegiada por uma excelente educação escolar, privilegiada porque "sabe pensar".

Normalmente, quem tem poder não quer correr o risco de perdê-lo para outro poderoso, e quem sabe pensar não quer ser ameaçado por uma outra cabeça pensante. Mas, enquanto essa minoria persistir, persiste também a acomodação geral, o que é um grande problema: uns mandam, outros obedecem automaticamente, "engolindo" todas as ordens.

Porque tamanha acomodação da maioria? Para onde foram aqueles tempos de inquietação e revoltas? Tempos onde não só interesses pessoais, mas a procura de respostas para grandes questões humanas, eram debatidas por grandes pensadores que influenciavam e enriqueciam muitos povos. Por que não evoluir? Por que não continuarmos a desenvolver mentes críticas e sedentas de verdade, cabeças que pensem por si mesmas e que consigam lutar pelo o que é justo e bom?

Desde que substituímos investigações filosóficas sobre o homem e o mundo pelas investigações científicas somente, todo o nosso conhecimento foi reduzido às especialidades: sabemos muito sobre quase nada e sabemos pouco sobre o todo.

Se o nosso conhecimento é especializado numa área do saber, é compreensível que sejamos acríticos e sem opinião sobre todas as demais áreas. Mas, existem hoje alguns estudos, algumas ciências que nos abrem a visão e o entendimento da realidade no seu todo, em vez da realidade de uma pequena parte? Nos ensine a pensar por nós mesmos, e não por fórmulas e receitas já prontas? Os maiores sábios e pensadores que já existiram, ou eram filósofos ou tiveram contato com a filosofia... realmente, uma ciência que "abarque" a possibilidade de conhecer o todo e que se relaciona com o objeto de todas as demais ciências, não há outra senão a Filosofia.

ESPIRITUALIDADE RENOVADA


UMA QUARESMA DIFERENTE
por Rogerio Arruda Martins

Olá, que bom ter você por aqui! Iniciamos, neste mês de março, uma nova etapa no Portal SCJ em que contaremos com a publicação eletrônica mensal da Revista Dehoniana. Nesta obra, assumirei esta coluna – “Espiritualidade Renovada” – que tem por objetivo, partilhar algumas direções do Espírito para a nossa vida de oração e intimidade com o Senhor (espiritualidade) numa dimensão, num olhar, e/ou num jeito renovado, ou seja, diferente e até rejuvenescido.
Quero colocar-me a sua disposição acerca de maiores esclarecimentos e até partilhas. Para tanto, na seção "Contatos" na página inicial da Revista, é possível encontrar meu e-mail.

Neste mês, falaremos sobre a Quaresma, este tempo forte na Igreja. Um tempo que se privilegia o recolhimento e o confrontar-se a fim de converter-se e, assim, progredir na fé.

Provavelmente, você já deve ter feito – ou ao menos escutado alguém fazer – uma comparação da Quaresma (40 dias) com os quarenta dias que Jesus passou no deserto após ter sido batizado (cf. Mt 4,1-2; Mc 1,12-13 e Lc 4,1-2).

De fato, a Igreja nos coloca esta comparação; este é um dos sentidos fortes da Quaresma: união da nossa vida com Jesus, sobretudo neste tempo de tentação e provação sofrido por Ele (cf. Catecismo da Igreja Católica nº 540).

Diante disso, quero partilhar com você algo diferente (lembra da nossa proposta?!): experimentarmos, nestes quarenta dias, o que experimentaram os discípulos de Emaús (Lc 24,13-35).

Mas discípulos de Emaús?! Eles “aparecem” após a Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus... por quê falar deles antes?! Vejamos.
Se você ainda não conhece esta passagem, não fique só na curiosidade, mas tome-a e leia-a. Você vai vibrar.

Os discípulos de Emaús estavam como que frustrados, pois o que deveria ter acontecido, parecia não ocorrido: aparentemente, Jesus estava morto e ponto final. Porém, enquanto discutiam, apareceu alguém misterioso que, muito “entrão”, quis fazer parte daquela conversa. Chegou como quem não quer nada, meio desinformado; os discípulos ficaram surpresos com o fato de que o “misterioso” não soubera da última (Jesus Nazareno fora morto).

Enquanto caminhavam para o povoado de Emaús, esses três iam conversando, embora o misterioso agora, falava um pouco mais. Discutiam sobre as Escrituras, sobre a história da salvação, enfim, sobre toda a espera do povo de Deus e a aparente frustração. Quando chegaram em Emaús - já estava anoitecendo - os discípulos, muito gentilmente, convidam o estranho para que ficasse com eles.

Sentados à mesa, o estranho tomou o pão, pronunciou a benção, partiu-o e deu a eles. “Espere! Nós conhecemos alguém que faz isto”.– disseram (podemos imaginar) os discípulos. Foi quando se deram conta de quem se tratava: JESUS. Imediatamente, Jesus desapareceu da frente deles.

Espantados, disseram um ao outro: “Não estava ardendo o nosso coração quando ele nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras?” (Lc 24,32) No mesmo instante, decidiram voltar à Jerusalém para testemunharem o que tinham visto e vivido.

Pois bem, aí está um grande roteiro para bem vivenciarmos a Quaresma: caminhar com Jesus – mesmo quando Ele não parecer conhecido – escutando-O falar de Si e da história da Salvação (Revelação); pedir que fique conosco; reconhecê-Lo no partir do pão (Eucaristia). Depois disto, cairmos em nós mesmos confessando que o nosso coração ardia quando falava-nos. O nosso ser estremece na presença do Senhor.

Acompanhados pelo Espírito Santo, consolados por Ele em nossas aflições, angústias, desesperos e desânimos, façamos esta experiência de caminhar esses quarenta dias ao lado de Jesus – partilhando as provações, as alegrias e as vidas – a fim de que, renovados dia após dia, chegando ao fim desta Quaresma (na Páscoa) possamos testemunhar, pelo que vimos e vivenciamos, tanto quanto aqueles discípulos, que Jesus está Vivo! Ele ressuscitou e está no meio de nós!

PROSEANDO


CAMINHAR AO ENCONTRO
por Giorgio Sinestri

No ano 2003, quando o Papa João Paulo II beatificou Madre Tereza de Calcutá, ele fez o mundo voltar os seus olhos para os pés desta mulher. Na ocasião, foi organizada uma exposição em homenagem à beata, e entre tantos objetos estavam as suas sandálias. Um simples calçado, já bastante gasto, que foi testemunha de tantas ações maravilhosas das quais, certamente, muitos de nós gostaríamos de presenciar.

Sandálias que calçavam os pés deformados e calejados devido as muitas e longas caminhadas a pé. Pés que nos convidam a refletir como seguir nossa caminhada.

Quando se ouve falar de caridade, logo se pensa nas mãos. As mãos que se estendem para ajudar, para confortar, para dar carinho e apoio. Com Madre Tereza foi diferente. O seu ensinamento está em nos fazer voltar os olhos para baixo, para o que se menos observa. Olhando para os seus pés desfigurados, ela nos impulsiona a nunca esperar que as pessoas venham até nós. Ela sempre tomava a iniciativa, ia em direção dos outros, era presença e se fazia serviço no seu caminhar constante.

Mas a vivência da caridade para Madre Tereza tinha, na oração profunda e constante, a fonte de toda a sua força. Rezando da forma como os indianos, ajoelhada por horas seguidas, os dedos dos pés também se moldaram, ficando transfigurados.
Seus pés ficaram deficientes, mas não se acomodaram diante da realidade que gritava por Deus. Madre Tereza caminhou e se colocou no meio de todos, sem ser o centro. Tornou a dignidade humana uma bandeira, cuidando daqueles que ninguém se aproximava.

Construiu a paz caminhando ...

MÚSICA CATÓLICA


NOVIDADES DA MÚSICA CATÓLICA
por José Ronaldo de Castro Gouvêa

Olá meu amigo, minha amiga. A paz do Coração de Jesus! Bem vindo à coluna musical do nosso site.

Você já parou para pensar sobre a grande importância que a música exerce no nosso dia-a-dia? Mais ainda as músicas que se fazem presentes nas nossas celebrações eucarísticas, meditações, retiros, orações ... Sendo assim, essa nossa página vem trazer indicações de cd´s de grandes bandas e cantores da música católica.

Artista: CELINA BORGES
Album: ANIMA (2006)
Ânima é o sexto trabalho da cantora. As canções são assinadas pela própria artista e por Adilson Freire, Adelso Freire, Jorge Mongó, entre outros. Ânima significa "alma". Cantar e louvar com todo o teu coração e com toda a tua alma.
MP3 - Derrama o Teu Amor Aqui

Artista: PADRE ZEZINHO SCJ
Album: MANHÃS ILUMINADAS(2006)
Gravadora: Paulinas/COMEP
Ao produzir Manhã Iluminadas, Pe Zezinho conta que quis dar continuidade a seus últimos trabalhos que versam sobre o processo de contemplação e compaixão, imprescindível a qualquer cristão, neste novo milênio.(Fonte: Portal da Música Católica)
PARA OUVIR: Manhãs iluminadas

MISSÃO


MISSÃO E CAMPANHA DA FRATERNIDADE
por José Lucio Gruber

“Seja amado por toda a parte, o Sagrado Coração de Jesus.”

A palavra missão deriva da palavra latina missio, que quer dizer envio. Jesus é o enviado do Pai, e o seu programa de missão é baseado na leitura que ele faz de um trecho do livro do profeta Isaias (Is 61,1-2), que nos é relatado no Evangelho segundo São Lucas: “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque ele me consagrou pela unção, para anunciar a Boa Notícia aos pobres; enviou-me para proclamar a libertação aos presos e aos cegos a recuperação da vista; para libertar os oprimidos, e para proclamar um ano da graça do Senhor.” (Lc 4,18-19).

Realizando esse programa missionário, Jesus revelou a face de Deus aos homens através de suas ações: acolhendo os pecadores, amando aqueles que eram desprezados, realizando curas para restabelecer a saúde e dignidade humana entre tantas outras ações, uma face de misericórdia aos homens.

Pelo batismo recebemos o mesmo Espírito Santo que conduziu Jesus na sua missão, e com Ele, o mesmo mandato missionário. Somos enviados ao mundo para revelar na sociedade de hoje o amor, a justiça, a paz, a alegria de Deus e lutar pela dignidade do ser humano. No Evangelho do oitavo domingo do Tempo Comum, refletimos através das comparações do vinho novo e da veste nova, que é necessário uma conversão plena e sincera a Deus, e que o jejum não é apenas por atos externos e obrigatórios, mas sim, por uma conduta de filhos de Deus que estão na sua presença, vivendo a alegria da vida nova. Afinal o jejum que Deus quer é para libertar os oprimidos, a partilha dos bens, enfim, criar uma sociedade nova. (cf. Is 58, 6 ss.).

Nesse espírito de mudança de atitude, a CNBB nos propõe o seguinte tema para a Campanha da Fraternidade deste ano: Fraternidade e Pessoas com Deficiência. Exorta-nos a viver a nossa missão para garantir os direitos das pessoas que possuem alguma deficiência e que ficam “à margem” da sociedade. O lema “Levanta-te e vem para o meio” (Mc 3,3), é o nosso compromisso, não só nos quarenta dias da quaresma, mas para toda a nossa vida: resgatar a dignidade do ser humano.

SER DEHONIANO


ACOLHER, AMAR E RESPEITAR
por Josimar Baggio

No mês de fevereiro, tive o prazer de participar, junto de dois dos meus colegas, de um encontro para pessoas com deficiência física. Interessante é observar essas pessoas. O sorriso sincero, a cordialidade com que nos acolhem e a simplicidade de coração, foram aspectos marcantes deste encontro.

Neste ano, a Igreja no Brasil também nos convida e nos convoca a refletir nesta quaresma sobre pessoas com deficiência. A Campanha da Fraternidade 2006 tem como lema "Levanta-te e vem para o meio" (Mc 3,3).

Num terceiro milênio em que o mundo nos impõe "rankings" de melhor "nisso" , melhor "naquilo"; num mundo que seleciona as capacidades do ser humano e os seres humanos pela sua capacidade; aonde o culto à beleza exterior e as chamadas "seleções naturais" são feitas até mesmo no modo de olhar das pessoas. Neste contexto, a Igreja é a voz que "grita no deserto" do mundo pós-contemporâneo. Grita pela valorização da dignidade humana e pelo respeito a todas as pessoas, especialmente neste ano às pessoas com deficiência.

Nós, atendendo ao convite do Senhor, devemos também, como reflexo do amor, do respeito que Deus tem por nós, amar e respeitar a todas as pessoas, especialmente "estes meus pequeninos", como diz o próprio Senhor.

Com certeza, é relevante que tenhamos um carinho todo especial para com as pessoas com deficiência, pois humanos, sabemos que todos somos imperfeitos e temos as nossas deficiências, nossos erros e nossas imperfeições. E assim sendo, não há motivo para que pensemos ser melhores ou mais perfeitos. Somos antes, pessoas diferentes, sim, mas filhos do mesmo Pai que nos ama e irmãos em Cristo Jesus.

Que neste tempo de reflexão, que a Igreja nos proporciona, possamos testemunhar na nossa vida, que o Reino de Deus é para todas as pessoas e que possamos e saibamos fazer o convite também às pessoas com deficiência "levanta-te e vem para o meio", para que elas possam estar junto de nós, sentindo-se bem em nosso meio como igreja que também são.

Eis, irmãos. a missão quaresmal deste ano: propagar e testemunhar que o nosso Deus é um Deus que acolhe a todos, que respeita a todos e que ama todos sem excessão. A seu exemplo, possamos também nós ser a cada dia mais amorosos, mais respéitosos e mais acolhedores com todas as pessoas que encontramos.

PALAVRA DO PAPA


MENSAGEM DO PAPA BENTO XVI PARA A QUARESMA

"Jesus, ao ver as multidões, encheu-Se de compaixão por elas" (Mt 9, 36).

Caríssimos irmãos e irmãs!

A Quaresma é o tempo privilegiado da peregrinação interior até Àquele que é a fonte da misericórdia. Nesta peregrinação, Ele próprio nos acompanha através do deserto da nossa pobreza, amparando-nos no caminho que leva à alegria intensa da Páscoa. Mesmo naqueles «vales tenebrosos» de que fala o Salmista (Sl 23, 4), enquanto o tentador sugere que nos abandonemos ao desespero ou deponhamos uma esperança ilusória na obra das nossas mãos, Deus guarda-nos e ampara-nos.

Sim, o Senhor ouve ainda hoje o grito das multidões famintas de alegria, de paz, de amor. Hoje, como aliás em todos os períodos, elas sentem-se abandonadas. E todavia, mesmo na desolação da miséria, da solidão, da violência e da fome que atinge indistintamente idosos, adultos e crianças, Deus não permite que as trevas do horror prevaleçam. De fato, como escreveu o meu amado Predecessor João Paulo II, há um «limite imposto ao mal, (…) a Misericórdia Divina» (Memória e identidade, 58). Foi nesta perspectiva que quis colocar, ao início desta Mensagem, a observação evangélica de que «Jesus, ao ver as multidões, encheu-Se de compaixão por elas» (Mt 9, 36).

À luz disto, queria deter-me a refletir sobre uma questão muito debatida pelos nossos contemporâneos: o desenvolvimento. Também hoje o «olhar» compassivo de Cristo pousa incessantemente sobre os homens e os povos. Olha-os ciente de que o «projeto» divino prevê o seu chamamento à salvação. Jesus conhece as insídias que se levantam contra esse projeto, e tem compaixão das multidões: decide defendê-las dos lobos, mesmo à custa da sua própria vida. Com aquele olhar, Jesus abraça os indivíduos e as multidões e entrega-os todos ao Pai, oferecendo-Se a Si mesmo em sacrifício de expiação.

Iluminada por esta verdade pascal, a Igreja sabe que, para promover um desenvolvimento integral, é necessário que o nosso «olhar» sobre o homem seja idêntico ao de Cristo. De fato, não é possível de modo algum separar a resposta às necessidades materiais e sociais dos homens da satisfação das necessidades profundas do seu coração. Isto deve ser ressaltado muito mais numa época como a nossa, de grandes transformações, em que nos damos conta de forma cada vez mais viva e urgente da nossa responsabilidade em relação aos pobres do mundo. Já o meu venerado Predecessor Papa Paulo VI com exatidão classificava os danos do subdesenvolvimento como uma subtração de humanidade.

Neste sentido, ele denunciava, na Encíclica Populorum progressio, «as carências materiais dos que são privados do mínimo vital, e as carências morais dos que são mutilados pelo egoísmo... as estruturas opressivas, quer provenham dos abusos da posse ou do poder, da exploração dos trabalhadores ou da injustiça das transações» (n. 21). Como antídoto para esses males, Paulo VI sugeria não só «a consideração crescente da dignidade dos outros, a orientação para o espírito de pobreza, a cooperação no bem comum, a vontade da paz», mas também «o reconhecimento, pelo homem, dos valores supremos, e de Deus que é a origem e o termo deles» . Nesta linha, o Papa não hesitava em propor, «finalmente e sobretudo, a fé, dom de Deus acolhido pela boa vontade do homem, e a unidade na caridade de Cristo» . Por conseguinte, o «olhar» de Cristo sobre a multidão obriga-nos a afirmar os verdadeiros conteúdos daquele «humanismo total» que, sempre segundo Paulo VI, consiste no «desenvolvimento integral do homem todo e de todos os homens»

Por isso, a primeira contribuição que a Igreja oferece para o desenvolvimento do homem e dos povos não se consubstancia em meios materiais nem em soluções técnicas, mas no anúncio da verdade de Cristo que educa as consciências e ensina a autêntica dignidade da pessoa e do trabalho, promovendo a formação de uma cultura que corresponda verdadeiramente a todas as exigências do homem.

À vista dos tremendos desafios da pobreza de grande parte da humanidade, a indiferença e a encerramento no próprio egoísmo apresentam-se em contraste intolerável com o «olhar» de Cristo. O jejum e a esmola, juntamente com a oração, que a Igreja propõe de modo especial no período da Quaresma, são uma ocasião propícia para nos conformarmos àquele «olhar». Os exemplos dos Santos e as múltiplas experiências missionárias que caracterizam a história da Igreja constituem indicações preciosas quanto ao melhor modo de apoiar o desenvolvimento. Mesmo neste tempo da interdependência global, pode-se verificar como nenhum projeto econômico, social ou político substitua aquele dom de si mesmo ao outro que brota da caridade.

Quem age segundo esta lógica evangélica, vive a fé como amizade com o Deus encarnado e, como Ele, provê às necessidades materiais e espirituais do próximo. Olha-o como mistério incomensurável, digno de infinito cuidado e atenção. Sabe que, quem não dá Deus, dá demasiado pouco; como dizia freqüentemente a Beata Teresa de Calcutá, a primeira pobreza dos povos é não conhecer Cristo. Por isso, é preciso levar a encontrar Deus no rosto misericordioso de Cristo: sem esta perspectiva, uma civilização não é construída sobre bases sólidas.

Graças a homens e mulheres obedientes ao Espírito Santo, surgiram na Igreja muitas obras de caridade, visando promover o desenvolvimento: hospitais, universidades, escolas de formação profissional, micro-empresas. São iniciativas que, muito antes de outras fórmulas da sociedade civil, deram provas de sincera preocupação pelo homem por parte de pessoas animadas pela mensagem evangélica. Estas obras apontam uma estrada por onde guiar também o mundo de hoje para uma globalização que tenha, ao centro, o verdadeiro bem do homem e conduza assim à paz autêntica.

Com a mesma compaixão que tinha Jesus pelas multidões, a Igreja sente hoje também como sua missão pedir, a quem tem responsabilidades políticas e competências no poder econômico e financeiro, que promova um desenvolvimento baseado no respeito da dignidade de todo o homem. Um indicador importante deste esforço há-de ser a liberdade religiosa efetiva, entendida como possibilidade não simplesmente de anunciar e celebrar Cristo, mas de contribuir também para a edificação de um mundo animado pela caridade.

Há que incluir neste esforço também a efetiva consideração do papel central que desempenham os autênticos valores religiosos na vida do homem enquanto resposta às suas questões mais profundas e motivação ética para as suas responsabilidades pessoais e sociais. Tais são os critérios sobre os quais os cristãos deverão aprender também a avaliar com sabedoria os programas de quem os governa.

Não podemos esconder que foram cometidos erros ao longo da história por muitos que se professavam discípulos de Jesus. Não raramente eles, confrontados com problemas graves, pensaram que se deveria primeiro melhorar a terra e depois pensar no céu. A tentação foi considerar que, perante necessidades urgentes, se deveria em primeiro lugar procurar mudar as estruturas externas. Para alguns, isto teve como conseqüência a transformação do cristianismo num moralismo, a substituição do crer pelo fazer. Por isso, com razão observava o meu Predecessor, de venerada memória, João Paulo II: «A tentação hoje é reduzir o cristianismo a uma sabedoria meramente humana, como se fosse a ciência do bom viver.

Num mundo fortemente secularizado, surgiu uma gradual secularização da salvação, onde se procura lutar sem dúvida pelo homem, mas por um homem dividido a meio, reduzido unicamente à dimensão horizontal. Ora, nós sabemos que Jesus veio trazer a salvação integral» (Enc. Redemptoris missio, 11).

É precisamente a esta salvação integral que a Quaresma nos quer guiar, tendo em vista a vitória de Cristo sobre todo o mal que oprime o homem. Quando nos voltarmos para o Mestre divino, nos convertermos a Ele, experimentarmos a sua misericórdia através do sacramento da Reconciliação, descobriremos um «olhar» que nos perscruta profundamente e que pode reanimar as multidões e cada um de nós. Esse olhar devolve a confiança a quantos não se fecharem no cepticismo, abrindo à sua frente a perspectiva da eternidade feliz. Portanto, já na história – mesmo quando o ódio parece prevalecer –, o Senhor nunca deixa faltar o testemunho luminoso do seu amor.

A Maria, «fonte viva de esperança» (Dante Alighieri, Paraíso, XXXIII, 12), confio o nosso caminho quaresmal, para que nos conduza ao seu Filho. De modo particular confio a Ela as multidões que, provadas ainda hoje pela pobreza, imploram ajuda, apoio, compreensão. Com estes sentimentos, a todos concedo de coração uma especial Bênção Apostólica.

Vaticano, 29 de Setembro de 2005.
Bento XVI