27 setembro 2006

Olha a edição de outubro

Edição n. 122 - "Mãe Aparecida, olhai pelo nosso Brasil!"

Nossa reportagem fala sobre os vários nomes e devoções por Maria. Ela é um ícone para nossa humanidade. Maria é exemplo de abertura ao Reino de Deus, de servidora, de missionária e uma esperança de que também chegaremos à glória, pois ela chegou. Sua humanidade faz-nos ser muito próximos dela e, se cuidou de Jesus, ela pode cuidar e interceder por nós hoje.
Mas, nossa edição tem também outros assuntos bem interessantes. Para assinar assinatura@iraopovo.com.br ou conheça nosso site: www.iraopovo.com.br

Alguns destaques da edição de outubro

Palavra de padre – pág. 07



Um santo completo
Padre Zezinho fala sobre dom Luciano Mendes de Almeida, falecido em agosto. Ele foi um homem e um bispo para todos os tempos.


Enfoque – pág. 08



Água e vida para o Semi-árido
Investir em educação, água, terra, produção e informação é o jeito que a Articulação no Semi-árido encontrou para proporcionar vida mais digna e feliz ao sertão brasileiro.



Notas pastorais – pág. 19



Pastoral do Dízimo
Ele é a melhor forma de manter economicamente a Igreja. Mas, para que alcance seus objetivos, é preciso que a Pastoral do Dízimo seja bem estruturada.



Fazedores da paz – pág. 24



No sobe e desce das águas
Os religiosos e as religiosas que partem em missão para a Amazônia e o Nordeste levam muito mais do que a Palavra de Deus e os sacramentos para o povo pobre dessas regiões.



Entrevista – pág. 25



Bispos falam de missão
Cinco pastores da Igreja no Brasil conversam com os leitores sobre seu trabalho episcopal e sobre os desafios missionários de suas dioceses.



Pensando a fé – pág. 31



Só o amor leva à eternidade
A vida eterna não se ganha nem se perde. Ela é o amor que vivemos aqui e que ultrapassa a eternidade. Esse é o recado de pe. João Batista Libânio ao responder uma questão de fé.



Viver o tempo – pág. 36



Lições do Círio de Nazaré
Para pe. Fábio de Melo, outubro é mês de muito simbolismo e grande riqueza. Ele conta um pouco do que a festa de Nossa Senhora de Nazaré, em Belém (PA), pode nos ensinar.

24 setembro 2006

IR ao POVO na Expocatólica

A revista IR ao POVO e sua equipe estiveram na IV Expocatolica no estande dos Dehonianos. Na oportunidade foram lançadas as camisetas IR ao POVO com dois modelos: um com a frase do pe. Dehon Se um homem deseja mudar a sociedade não pode ter idéias tímidas e o outro com o ícone da capa de junho feito pelo frater Valdemar Scramin, scj com a frase Se alguém tem sede,venha a mim e beba. Na foto da esquerda para direita: a jornalista Terêzia Dias; Frater Damião Pereira, da divulgação; Karina Del Monte e Cássia Ferreira, do Departamento de Administração e Assinaturas. 

18 setembro 2006

Discurso do Papa Bento XVI em Regensburg - na íntegra

Leia abaixo a íntegra do discurso do papa na Universidade de Regensburg. O título da palestra de Bento XVI é “Fé, Razão e a Universidade: Memórias e Reflexões”.
(atualizado em 20 de setembro, em substituição aos trechos selecionados)

Ilustres Senhores, gentis Senhoras!
É emocionante para mim estar novamente na cátedra da universidade e poder dar uma vez mais uma aula. Meu pensamento volta àqueles anos em que, depois de um maravilhoso período no Instituto Superior de Freising, iniciei minha atividade de professor acadêmico na Universidade de Bonn. 1959 era ainda o tempo da velha universidade dos professores ordinários. Para as cátedras individuais não existiam nem assistentes nem datilógrafos, mas em compensação havia um contato muito direto com os estudantes e principalmente também entre os professores. Davam-se encontros antes e depois das lições nos quartos dos docentes. Os contatos com os historiadores, os filósofos, os filólogos e naturalmente também entre as duas faculdades teológicas eram muito estreitos. Uma vez por semestre havia um assim chamado dies academicus , em que os professores de todas as faculdades se apresentavam diante dos estudantes de toda a universidade, fazendo possível uma verdadeira experiência de universitas : o fato de que nós, não obstante todas as especializações, que às vezes nos fazem incapazes de nos comunicar entre nós, formamos um todo e trabalhamos no todo da única razão com suas várias dimensões, estando assim juntos também na comum responsabilidade pelo reto uso da razão; convertia-o em experiência viva. A universidade, sem dúvida, estava orgulhosa também de suas duas faculdades teológicas. Era claro que também elas, interrogando-se sobre a racionalidade da fé, desenvolvem um trabalho que necessariamente faz parte do "todo" da universitas scientiarum , inclusive se não todos podiam compartilhar a fé, por cuja correlação com a razão comum se esforçam os teólogos. Esta coesão interior no cosmos da razão tampouco foi perturbada quando se soube que um dos colegas havia dito que em nossa universidade havia uma estranheza: duas faculdades que se ocupavam de uma coisa que não existia: Deus. Que também frente a um ceticismo assim radical permanece necessário e razoável interrogar-se sobre Deus por meio da razão e aquilo deva ser feito no contexto da tradição da fé cristã; no conjunto da universidade era uma convicção indiscutível.

Tudo isto veio à minha mente quando recentemente li a parte editada pelo professor Theodore Khoury (Münster) do diálogo que o douto Imperador bizantino Manuel II Paleólogo, talvez durante o tempo de inverno do 1391 em Ankara, teve com um persa culto sobre o Cristianismo e o Islã, e a verdade de ambos. Foi provavelmente o Imperador mesmo quem anotou, durante o assédio de Constantinopla entre 1394 e 1402, este diálogo. Explica-se isto porque seus raciocínios são reportados muito mais detalhadamente que as respostas do erudito persa. O diálogo trata o âmbito das estruturas da fé contidas na Bíblia e no Corão e se detém sobretudo na imagem de Deus e do homem, mas necessariamente também na relação entre as "três Leis": Antigo Testamento –Novo Testamento- Corão. Queria tocar nesta lição só um argumento –mais que nada marginal na estrutura do diálogo– que, no contexto do tema "fé e razão" me fascinou e que servirá como ponto de partida para minhas reflexões sobre este tema.

Na sétima conversa editada pelo professor Khoury, o imperador toca o tema da jihad (guerra santa). Certamente o imperador sabia que na sura 2, 256 se lê: "Nenhuma constrição nas coisas da fé". É uma das suras do período inicial em que Maomé mesmo ainda não tinha poder e estava ameaçado. Mas, naturalmente, o Imperador conhecia também as disposições, desenvolvidas sucessivamente e fixadas no Corão, aproxima a guerra santa. Sem deter-se nos particulares, como a diferença de tratamento entre aqueles que possuem o "Livro" e os "incrédulos", ele, de modo surpreendentemente brusco, dirige-se a seu interlocutor simplesmente com a pergunta central sobre a relação entre religião e violência, em geral, dizendo: "mostre-me também aquilo que Maomé trouxe de novo, e encontrará somente coisas malvadas e desumanas, como sua diretiva de difundir por meio da espada a fé que ele pregava". O Imperador explica assim minuciosamente as razões pelas quais a difusão da fé mediante a violência é uma coisa irracional. A violência está em contraste com a natureza de Deus e a natureza da alma. "Deus não goza do sangue; não atuar segundo a razão é contrário à natureza de Deus. A fé é fruto da alma, não do corpo. Quem portanto quer conduzir o outro à fé necessita da capacidade de falar bem e de raciocinar corretamente, não da violência nem da ameaça… Para convencer uma alma racional não é necessário dispor nem do próprio braço, nem de instrumentos para agredir nem de nenhum outro meio com o que se possa ameaçar uma pessoa de morte…".

A afirmação decisiva nesta argumentação contra a conversão mediante a violência é: não agir segundo a razão é contrário à natureza de Deus. O editor, Theodore Khoury, comenta que para o imperador, como bizantino crescido na filosofia grega, esta afirmação é evidente. Para a doutrina muçulmana, ao contrário, Deus é absolutamente transcendente. Sua vontade não está ligada a nenhuma de nossas categorias, inclusive àquela da racionalidade. Neste contexto Khoury cita uma obra do conhecido islamista francês R. Arnaldez, que a destaca a Ibh Hazn que vai até o ponto de declarar que Deus não estaria ligado nem sequer por sua mesma palavra e que nada o obrigaria a nos revelar a verdade. Se fosse sua vontade, o homem deveria praticar também a idolatria.

Aqui se abre, na compreensão de Deus e portanto na realização concreta da religião, um dilema que hoje nos desafia de um modo muito direto. A convicção de atuar contra a razão está em contradição com a natureza de Deus, é somente um pensamento grego ou vale sempre por si mesmo? Penso que neste ponto se manifesta a profunda concordância entre aquilo que é grego no melhor sentido e aquilo que é fé em Deus sobre o fundamento da Bíblia. Modificando o primeiro verso do Livro do Gênesis, João iniciou o prólogo de seu Evangelho com as palavras: "Ao princípio era o logos". É justamente esta palavra a que usa o imperador: Deus atua com logos . Logos significa conjunto de razão e palavra, uma razão que é criadora e capaz de comunicar-se, mas, como razão. João com aquilo nos doou a palavra conclusiva sobre o conceito bíblico de Deus, a palavra em que todas as vias freqüentemente fatigantes e tortuosas da fé bíblica alcançam sua meta, encontrando sua síntese. No princípio era o logos , e o logos é Deus, diz-nos o evangelista. O encontro entre a mensagem bíblica e o pensamento grego não era uma simples casualidade. A visão de São Paulo, diante do qual se fechou os caminhos da Ásia e que, em sonhos, viu um macedônio e escutou sua súplica: "Vem à Macedônia e nos ajude!", esta visão pode ser interpretada como uma "condensação" da necessidade intrínseca de uma aproximação entre a fé bíblica e o interrogar-se grego.

Na verdade, esta aproximação já se iniciou desde há muito tempo. Já o nome misterioso de Deus da sarça ardente, que separa Deus do conjunto das divindades com múltiplos nomes afirmando somente seu ser, é, confrontando-se com o mito, uma resposta com a que está em íntima analogia a tentativa de Sócrates de vencer e superar o mito mesmo. O processo iniciado para a sarça alcança, ao interior do Antigo Testamento, uma nova maturidade durante o exílio, onde o Deus de Israel, agora privado da Terra e do culto, anuncia-se como o Deus do céu e da terra, apresentando-se com uma simples fórmula que prolonga as palavras da sarça: "Eu sou". Com este novo conhecimento de Deus vai ao mesmo paso uma espécie de iluminismo, que se expressa de modo drástico na mofa das divindades que são somente obra das mãos do homem. Assim, não obstante toda a dureza do desacordo com os soberanos helenísticos, que queriam obter com a força a adequação ao estilo de vida grego e a seu culto idolátrico, a fé bíblica, durante a época helenística, ia interiormente ao encontro da melhor parte do pensamento grego, até um contato recíproco que depois se realizou especialmente na tardia literatura sapiencial. Hoje nós sabemos que a tradução grega do Antigo Testamento, realizada na Alexandria –a Bíblia dos "Setenta" –, é mais que uma simples (por avaliar de modo talvez pouco positivo) tradução do texto hebraico: é de fato um testemunho textual a si devido, e um específico e importante passo da história da Revelação, no qual se realizou este encontro de um modo que para o nascimento do cristianismo e sua divulgação teve um significado decisivo. No fundo, trata-se do encontro entre fé e razão, entre autêntico iluminismo e religião. Partindo verdadeiramente da íntima natureza da fé cristã e, ao mesmo tempo, da natureza do pensamento helenístico fundido já com a fé, Manuel II podia dizer: Não atuar "com o logos " é contrário à natureza de Deus.

Honestamente é necessário anotar, que na tardia Idade Média, desenvolveram-se na teologia tendências que rompem esta síntese entre espírito grego e espírito cristão. Em contraste com o assim chamado intelectualismo agostiniano e tomista que iniciou com o Duns Scoto uma impostação voluntarística, a qual ao final levou a afirmação que nós conheceremos de Deus somente a voluntas ordinata . Além desta existiria a liberdade de Deus, em virtude da qual Ele teria podido criar e fazer também o contrário de tudo aquilo que efetivamente tem feito. Aqui se perfilam posições que, sem lugar a dúvidas, podem aproximar-se daquelas do Ibn Hazn e poderiam levar até a imagem de um Deus- Árbitro, que não está ligado nem sequer à verdade e ao bem. A trascendência e a diversidade de Deus são acentuadas de modo tão exagerado, que também nossa razão, nosso sentido do verdadeiro e do bem não são mais um verdadeiro espelho de Deus, cujas possibilidades abismais permanecem para nós eternamente inalcançáveis e escondidas atrás de suas decisões efetivas. Em contraste com isso, a fé da Igreja ateve-se sempre à convicção de que entre Deus e nós, entre seu eterno Espírito criador e nossa razão criada, existe uma verdadeira analogia, em que certamente as dessemelhanças são imensamente maiores que as semelhanças, mas não ao ponto de abolir a analogia e sua linguagem. Deus não se faz mais divino pelo fato de que o empurremos longe de nós em um voluntarismo puro e impenetrável, mas sim o Deus verdadeiramente divino é aquele Deus que se mostrou como o logotipos e como logotipos atuou e atua cheio de amor a nosso favor. Certo, o amor "sobrepassa" o conhecimento e é por isso capaz de perceber mais que o simples pensamento, entretanto permanece como o amor de Deus – logos , pelo qual o culto cristão é um culto que concorda com o Verbo eterno e com nossa razão.

A aqui mencionada recíproca aproximação interior, que se teve entre a fé bíblica e o interrogar-se sobre o plano filosófico do pensamento grego, é um dado de importância decisiva não só do ponto de vista da história das religiões, mas também desde aquilo da história universal –um dado que nos obriga também hoje. Considerado este encontro, não é surpreendente que o cristianismo, não obstante sua origem e importante desenvolvimento no Oriente, tenha encontrado seu rastro historicamente decisivo na Europa. Podemos expressá-lo também inversamente: este encontro, ao qual se adiciona ainda sucessivamente o patrimônio de Roma, criou a Europa e permanece como fundamento daquilo que, com razão, pode-se chamar a Europa.

À tese de que o patrimônio grego, criticamente purificado, seja uma parte integrante da fé cristã, opõe-se o pedido da deselenização do cristianismo, um pedido que desde o início da idade moderna domina de modo crescente a busca teológica. Visto mais de perto, podem-se observar três ondas no programa da deselenização: embora relacionadas entre si, em suas motivações e em seus objetivos são claramente distintas uma da outra.
A deselenização emerge primeiro em conexão com postulados fundamentais da Reforma do século XVI. Considerando a tradição das escolas teológicas, os reformadores se viam diante de uma sistematização da fé condicionada totalmente pela filosofia, diante, quer dizer, de uma determinação da fé do externo com força em um modo de pensar que não derivava desta. Assim, a fé não aparecia mais como vivente palavra histórica, mas sim como elemento inserido na estrutura de um sistema filosófico. A sola Scriptura ao contrário, busca a pura forma primitiva da fé, como esta mesma está presente originariamente na Palavra bíblica. A metafísica aparece como um pressuposto derivado de outra fonte, da que ocorre libertar a fé para fazê-la retornar a ser totalmente ela mesma. Kant atuou baseado neste programa com uma radicalidade imprevisível para os reformadores. Com isso ele ancorou a fé exclusivamente à razão prática, negando-lhe o acesso ao todo da realidade.

A teologia liberal dos séculos XIX e XX acompanha a segunda etapa do processo de deselenização, com Adolf von Harnack, como seu máximo representante. Quando era estudante e em meus primeiros anos como docente, este programa influenciava altamente a teologia católica também. Tomou como ponto de partida a distinção que Pascal faz entre o Deus dos filósofos e o Deus de Abraão, Isaac e Jacob. Em meu discurso inaugural em Bonn em 1959 tratei de me referir a este assunto. Não repetirei aqui o que disse naquela ocasião, mas eu gostaria de descrever, ao menos brevemente, o que era novo neste processo de deselenização. A idéia central de Harnack era voltar simplesmente ao homem Jesus e a sua mensagem simples, sem as adições da teologia e inclusive com a helenização: Esta simples mensagem foi vista como a culminação do desenvolvimento religioso da humanidade. Dizia-se que Jesus pôs fim ao culto em favor da moralidade. Ao final era apresentado como o pai da mensagem moral humanitária. A meta fundamental era fazer que o Cristianismo estivesse em harmonia com a razão moderna, quer dizer, liberando-o dos elementos aparentemente filosóficos e teológicos, como a fé na divindade de Cristo e em Deus Uno e Trino. Neste sentido, a exegese histórica-crítica do Novo Testamento restaurou o lugar da teologia na universidade: Para Harnack, a teologia é algo essencialmente histórico e portanto estritamente científico. O que se pode dizer criticamente de Jesus, é por assim dizer, expressão da razão prática e conseqüentemente se pode aplicar à Universidade como um tudo. Neste pensamento se apóia a própria limitação da razão, classicamente expressa nas "Críticas" de Kant, mas nesse momento radicalizada pelo impacto das ciências naturais. Este conceito moderno está apoiado, para dizê-lo brevemente, na síntese entre o Platonismo (Cartesianismo) e o empirismo, uma síntese confirmada pelo sucesso da tecnologia. Por um lado pressupõe a estrutura matemática da matéria, e sua intrínseca racionalidade, que faz possível entender como a matéria funciona e a usa eficientemente: Esta premissa básica é, por assim dizer, o elemento platônico no entendimento moderno da natureza. Por outro lado, existe a capacidade da natureza de ser explorada para nossos propósitos, e neste caso só a possibilidade da verificação ou falsificação através da experimentação pode chegar à certeza final. O peso entre os dois pólos pode, dependendo das circunstâncias, mudar de um lado ao outro. Como fortemente o fez o pensador positivista J. Monod, que declarou a si mesmo um convencido platonista/cartesiano.

Isto permite que emerjam dois princípios que são cruciais para o assunto ao que chegamos. Primeiro, só a classe de certeza que resulta de interpolar elementos matemáticos com empíricos pode se considerar científica. Qualquer disciplina que queira exigir status de ciência deve ser medido com este critério. Daí que as ciências humanas, como a história, psicologia, sociologia e filosofia, não possam se conformar a este cânon de cientificidade. Um segundo ponto que é importante para nossas reflexões, é que por sua própria natureza este método exclui a pergunta de Deus, fazendo-a aparecer como não científica ou pré-científica. Conseqüentemente, enfrentamos uma redução do raio da ciência e da razão, que precisa ser questionado.

Devemos retornar ao problema depois. Enquanto isso, há que observar-se que desde este lugar, qualquer tentativa da teologia de manter seu status de "científica" terminaria por reduzir o Cristianismo a um simples fragmento de si mesmo. Mas temos que dizer mais: É o homem mesmo quem termina sendo reduzido, as perguntas especificamente humanas sobre nossa origem e nosso destino, as perguntas originadas da religião e da ética, já não têm lugar no modo de ver da razão coletiva definida como "ciência" e tem que relegar-se ao espaço do subjetivo. É o sujeito quem decide então, apoiado em sua experiência, o que considera é matéria da religião, e a "consciência" subjetiva se converte somente no árbitro do que é ético. Desta maneira, entretanto, a ética e a religião perdem seu poder de criar uma comunidade e se convertem em um assunto completamente pessoal. Este é um estado perigoso para os assuntos da humanidade, como podemos ver nas diversas patologias da religião e a razão que necessariamente emergem quando a razão é tão reduzida que as perguntas da religião e a ética já não preocupam. Tentativas de construir a ética a partir das regras da evolução ou a psicologia terminam sendo simplesmente inadequados.

Antes de esgrimir as conclusões às que tudo isto leva, tenho que me referir brevemente à terceira etapa de deselenização, que ainda está acontecendoe. À luz de nossa experiência com o pluralismo cultural, com freqüência se diz em nossos dias que a síntese com o Helenismo obtida pela Igreja em seus inícios foi uma inculturação preliminar que não deve ser vinculante para outras culturas. Este último se diz para ter o direito a voltar para simples mensagem do Novo Testamento anterior à inculturação, para inculturá-lo novamente em seus meios particulares. Esta tese não é falsa, mas sim é ordinária e imprecisa. O Novo Testamento foi escrito em grego e traz consigo a estampagem do espírito grego, que chegou à maturidade dado que o Antigo Testamento se desenvolveu. Certo, há elementos na evolução da Igreja em seus inícios que não devem se integrar em todas as culturas, Entretanto, as decisões fundamentais sobre as relações entre a fé e o uso da razão humana são parte da fé mesma, são desenvolvimentos conseqüentes com a natureza da própria fé.

E assim chego à conclusão. Esta tentativa, feita com umas poucas pinceladas, de uma crítica à razão moderna desde dentro, não tem nada a ver pondo o relógio no tempo anterior ao Iluminismo e rejeitar as perspectivas da era moderna. Os aspectos positivos da modernidade devem ser conhecidos sem reserva: Estamos todos agradecidos pelas maravilhosas possibilidades que abriram para a humanidade e para o progresso que nos deu. O ethos científico, além disso, deve ser obediente à verdade, e, como tal, leva uma atitude que se reflete nos princípios do Cristianismo. A intenção aqui não é o reducionismo ou a crítica negativa, mas sim ampliar nosso conceito de razão e sua aplicação. Enquanto nos regozijamos nas novas possibilidades abertas à humanidade, também podemos contemplar os perigos que emergem destas possibilidades e temos que nos perguntar como podemos superá-las. Teremos êxito ao fazê-lo somente se a razão e a fé avançarem juntas de um modo novo, se superarmos a limitação imposta pela razão mesma ao que é empiricamente verificável, e se uma vez mais gerarmos novos horizontes. Neste sentido a teologia pertence corretamente à universidade e está dentro do amplo diálogo das ciências, não só como uma disciplina histórica e ciência humana, mas precisamente como teologia, como uma aprofundamento na racionalidade da fé.

Só assim nos fazemos capazes de obter este diálogo genuíno de culturas e religiões que necessitamos com urgência hoje. No mundo ocidental se sustenta amplamente que somente a razão positivista e as formas da filosofia apoiadas nela são universalmente válidas. Inclusive as culturas profundamente religiosas vêem esta exclusão do divino da universalidade da razão como um ataque a suas mais profundas convicções. Uma razão que é surda ao divino e que relega a religião ao espectro das subculturas é incapaz de entrar em diálogo com as culturas. Ao mesmo tempo, como tratei que demonstrar, a razão científica moderna com seus elementos intrinsecamente platônicos gera uma pergunta que vai além de si mesmo, de suas possibilidades e de sua metodologia. A razão científica moderna simplesmente tem que aceitar a estrutura racional da matéria e sua correspondência entre nosso espírito e as estruturas racionais que prevalecem como nos deu, nas que sua metodologia deve se apoiar. Inclusive a pergunta por que isto tem que ser assim? é uma questão real, que tem que ser dirigida pelas ciências naturais a outros modos e planos de pensamento: À filosofia e à teologia. Para a filosofia e, embora seja certo que de outra forma, para a teologia, escutar as grandes experiências e perspectivas das tradições religiosas da humanidade, de maneira particular aquelas da fé cristã, é fonte de conhecimento; ignorá-la seria uma grave limitação para nossa escuta e resposta. Aqui recordo algo que Sócrates disse a Faedo. Em conversas anteriores, verteram-se muitas opiniões filosóficas falsas, e por isso Sócrates diz: "Seria mais facilmente compreensível se a alguém incomodassem tanto todas estas falsas noções que pelo resto de sua vida desdenhasse e se burlasse de toda conversação sobre o ser, mas desta forma estaria privado da verdade da existência e sofreria uma grande perda".

O Ocidente foi posto em perigo por muito tempo por esta aversão em que se apóia sua racionalidade, e portanto só pode sofrer grandemente. A coragem para comprometer toda a largura da razão e não a negação de sua grandeza: Este é o programa com o que a teologia ancorada na fé bíblica ingressa no debate de nosso tempo. "Não atuar razoavelmente (com logos) é contrário à natureza de Deus" disse Manuel II, de acordo com o entendimento cristão de Deus, em resposta a seu interlocutor persa. É a este grande logos, à largura da razão, onde convidamos a nossos companheiros no diálogo das culturas. É a grande tarefa da universidade redescobri-lo constantemente.

Nota: O Santo Padre deseja proporcionar uma versão posterior deste texto, complementado com notas de rodapé. portanto, o presente texto deve ser considerado provisório.

Texto original em alemão.
Fonte: Sala de Imprensa da Santa Sé.
Tradução: ACI Prensa.

Bento XVI: convite ao diálogo

por Dom Juan del Río, presidente da Comissão de Meios de Comunicação da Conferência Episcopal Espanhola

Todos conhecem os protestos de setores do mundo muçulmano pela alusão a Maomé em um discurso acadêmico de Bento XVI na Universidade de Ratisbona. Quando há discussão por algo dito, creio que é melhor ir ao texto completo, não a extratos, para ver o que se deduz dele. O primeiro aspecto a ter presente é que se trata de uma lição de teologia titulada: «Fé, razão e universidade. Lembranças e reflexões».

Não é uma homilia, nem uma catequese, mas um texto acadêmico. Quem o ministra é o sucessor de Pedro, também professor universitário, teólogo e um dos grandes pensadores da atualidade. O ambiente em que se pronuncia o discurso é o de um ato solene frente a intelectuais alemães. Fala um veterano professor, que regressa ao que é quase sua casa. O Papa fala do que sempre lhe fascinou: «Fé e razão».

Como todo cientista, trata primeiro das dificuldades. Recorda uma frase de um antigo colega acético: «Nossa universidade tinha algo estranho: duas faculdades que se ocupavam de algo que não existia: Deus». Também cita um livro recente, onde aparece um diálogo que manteve em 1391 o imperador de Bizâncio, Manuel II Paleólogo, sobre o Cristianismo e o Islã. O imperador fala da relação entre religião e violência, aludindo ao profeta Maomé, a quem atribui, entre outras críticas, a «ordem de difundir a fé usando a espada».

O Papa não diz em nenhum momento que esteja de acordo com o citado, mas o toma como ponto de partida dialético, próprio do discurso universitário, para chegar à chave da argumentação: «A fé mediante a violência é algo irracional... Não atuar segundo a razão é contrário à natureza de Deus». Sentido do discursoEstudando o texto da dissertação, não se deduz racionalmente ofensa ao Islã. É certo que, em duas linhas entre seis páginas, cita a opinião deste personagem do medieval adversa ao profeta Maomé; isso é algo que pertence à história.

Contudo, pode-se dizer que fazer uma crítica irada sobre as intenções do Papa, de maneira disforme e tendenciosa, a partir de uma simples nota histórica, perfeitamente acoitada, ignorando o resto não é racionalmente aceitável. É que cada vez que se consigna uma opinião adversa, com a qual obviamente não se está de acordo pela trajetória anterior, é preciso dizer depois de cada frase? É que há que excluir as boas intenções? A finalidade do discurso é pôr de manifesto que a fé em Deus é fonte de paz, não de guerra.

O próprio Bento XVI o disse em uma mensagem ao encontro ecumênico de Assis: «As manifestações de violência não podem atribuir-se à religião enquanto tal, mas aos limites culturais com os que se vive e desenvolve no tempo...». A opção do Papa em favor do diálogo inter-religioso e intercultural é inequívoca: pode-se comprovar em todo seu pensamento teológico, expresso em livros anteriores e nos diversos pronunciamentos que, neste ano e meio de pontificado, ele vem fazendo sobre «cultura, religião e violência».

Luta, isso sim, contra uma idéia da secularização do ocidente imposta por velhos intelectuais ancorados no passado, estendida depois de 11 de setembro de 2001 e amplificada nos meios de comunicação, de que a fé em um Deus e as convicções religiosas trazem inexoravelmente fanatismo e violência.

Por isso mesmo, nas conclusões de seu discurso em Ratisbona, ele diz: «As culturas profundamente religiosas do mundo vêem na exclusão do divino e na universalidade da razão um ataque às suas convicções mais arraigadas. Uma razão que é surda ao divino e que relega a religião ao espectro da sub-cultura é incapaz de entrar em diálogo com as culturas». Isto inclui, evidentemente, a religião monoteísta islâmica. É isto um ataque a sua fé?Reflexão e diálogoO Papa tenta em seu discurso ampliar o conceito de razão, que a sociedade de consumo imposta desde o poder, conduz ao ascetismo ou cinismo frente ao sagrado, negando a possibilidade de conhecer a transcendência, desvalorizando os sentimentos religiosos e reduzindo toda manifestação humana ao puramente material.

O discurso não vai contra ninguém, e menos contra os muçulmanos, adoradores do Deus único, porque defende até a morte como sendo necessário e razoável interrogar-se sobre Deus. No reconhecimento do «único Deus, vivo, misericordioso e todo-poderoso» (Nostra Aetate 3) nos podemos encontrar cristãos e muçulmanos. Bento XVI, mais que ofender e atacar o Islã, dá alento às pessoas de fé, muçulmanos inclusive, que rejeitam a violência religiosa, venha do fanatismo ou do poder.

Ante a reação veemente e excitadora que aparecera em relação às palavras do Papa, não se podem evitar algumas perguntas: O que se transmitiu às pessoas simples do que realmente disse o bispo de Roma na Alemanha? Que intencionalidade se esconde em tirar uma brevíssima citação histórica fora de uma lição universitária que trata de uma nova relação entre fé e razão? Existem forças ocultas interessadas em potenciar o fanatismo e a violência de determinados setores de diversas religiões para enfrentar cristãos entre si e estes contra muçulmanos?

O Papa se apropriou do sentimento de milhões de pessoas de fé que, de uma maneira ou de outra, estão dizendo que a religião não pode ser fundamento de um conflito, de uma guerra, de nenhum tipo de violência, material ou social. Por isso, deve-se concluir que o verdadeiro significado do discurso do Santo Padre em sua totalidade era e é um convite franco e sincero ao diálogo.

Fonte: Zenit

16 setembro 2006

Vaticano esclarece interpretações das palavras do Papa sobre o Islã

A Zenit publicou a declaração que o diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, o Pe. Federico Lombardi, S.J., entregou aos jornalistas na tarde desta quinta-feira, dia 14, sobre as interpretações de algumas passagens do discurso que o Papa Bento XVI pronunciou na Universidade de Ratisbona em 12 de setembro.

"A propósito das reações de alguns representantes muçulmanos acerca de certas passagens do discurso do Santo Padre na Universidade de Ratisbona, é oportuno observar que, como se desprende de uma atenta leitura do texto, o que interessa ao Santo Padre é uma rejeição clara e radical da motivação religiosa da violência. Sem dúvida, não era intenção do Santo Padre levar a cabo um estudo profundo sobre a yihad e sobre o pensamento muçulmano nesse sentido, e muito menos ofender a sensibilidade dos crentes muçulmanos.

Ao contrário, nos discursos do Santo Padre aparece com clareza a advertência, dirigida à cultura ocidental, de que se evite «o desprezo de Deus e o cinismo que considera a irrisão do sagrado como um direito da liberdade» (discurso de 10 de setembro), a justa consideração da dimensão religiosa é efetivamente uma premissa essencial para um diálogo frutuoso com as grandes culturas e religiões do mundo.

Assim, nas conclusões do discurso na Universidade de Ratisbona, Bento XVI afirmou: «As culturas profundamente religiosas do mundo vêem na exclusão do divino da universalidade da razão um ataque às suas convicções mais arraigadas. Uma razão que frente ao divino é surda e relega a religião ao âmbito de uma cultura de segundo grau é incapaz de integrar-se no diálogo das culturas».

Portanto, fica clara a vontade do Santo Padre de cultivar uma atitude de respeito e diálogo para com as outras religiões e culturas, evidentemente também para com o Islã. "